Do JC Online
Foto: Daniel Valença/Facebook
O cantor pernambucano Alceu
Valença foi atropelado, essa semana, por uma bicicleta, enquanto
caminhava na orla da praia do Leblon, no Rio de Janeiro, onde atualmente
mora. O compositor sofreu uma fratura na mão esquerda e teve que
cancelar um show que faria no final do mês, no Teatro Oi Casagrande, no
Rio. Apesar de estar com a mão enfaixada, Alceu está confirmado para
cantar na Festa da Renascença, nesta sexta-feira (16), em Pesqueira.
Veja o depoimento do cantor sobre o acidente:
Adoro andar de bicicleta. Mas neste dia
deixei minha eguinha na garagem e resolvi caminhar da minha casa, no
Leblon, até o Arpoador e voltar. Enquanto retornava pelo calçadão, ia
cantarolando as belezas do Rio: “Eu te procuro no Leblon, Copacabana /
vejo velas de umbanda / um buquê jogado ao mar”.
Ao passar em frente ao Posto 9, cantei:
“Andar andar / nas ruas do Rio de Janeiro / dezembro abril / a todo
mundo eu dou psiu / perguntando por meu bem /ainda resta um assobio / um
desejo, nada além”.
Ao me aproximar do Jardim de Alah,
lembrei de uma canção que compus há muitos anos, logo que cheguei na
Cidade Maravilhosa: “Era verão na cidade de São Sebastião / do meu Rio
de Janeiro / fevereiro se rendia / se entregando por inteiro / seu azul
seu mormaço a março que é mês do desejo..”.
Parei numa barraca de coco e fiquei
contemplando o pôr-do-sol dourado e divino que desmaiava junto ao Morro
Dois Irmãos. O sol caiu lentamente enquanto a lua surgia no céu. Em
silêncio, quando somente as imagens sem música povoavam a minha mente,
caminhei até o final do Leblon. Passei por manifestantes acampados que
protestavam contra Cabral.
Sigo em frente e olho para os lados
antes de atravessar a pista. No lado esquerdo, carros retidos diante do
sinal fechado. Olho para o outro lado, não vejo ninguém. Coloco o pé na
ciclovia e, num susto, vejo aproximar-se de mim o vulto de um ciclista
todo vestido de preto, numa velocidade inacreditável. Joguei o corpo
para trás, mas senti que o guidon se chocara contra minha mão esquerda.
Urrei de dor.
Ainda tive tempo de escutar alguém que
passava gritar para o desastrado ciclista: “Filho-da-Puta!”, enquanto o
sujeito desaparecia a toda velocidade pela infinita ciclovia. Não havia
mais som ou imagem. Fui direto para uma clínica e obtive o diagnóstico:
fratura na mão esquerda, quatro semanas sem tocar violão. Tive de adiar
meu show acústico no Teatro Oi Casagrande, que estava marcado para o fim
do mês (e passou para o dia 17 de setembro).
No dia seguinte, desafiando a mim mesmo,
saio para caminhar com um braço imobilizado e pendurado na tipoia.
Muitos param para me perguntar o que acontecera com minha mão e relato
pacientemente o ocorrido. Um gari da prefeitura se aproxima, cantando
“Anunciação”. Quando explico o acidente, o gari resume, com sabedoria:
“ciclovia não é pista de corrida”. Andar, andar nas ruas do Rio.
Desviando dos buracos nas calçadas de pedrinhas portuguesas e de
ciclistas inconsequentes. O direito de um termina quando começa o do
outro.
Alceu Valença
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