FOTO: BERTRAND GUAY/AFP |
Pela primeira vez, um medicamento contra covid-19 gera esperança por aumentar a sobrevida em pacientes que evoluem para a forma grave da infecção. Estamos falando do corticoide dexametasona. De baixo custo, a medicação é capaz de reduzir a mortalidade em um terço nas pessoas que precisam do respirador mecânico, segundo anunciaram, nesta terça-feira (16), os responsáveis do ensaio clínico Recovery – o mesmo estudo que concluiu que a hidroxicloroquina não tem efeito benéfico contra o novo coronavírus. Em Pernambuco, tanto nos hospitais da rede pública quanto nos privados, a dexametasona já vem sendo utilizada nos casos de covid-19 mais severos.
“É uma medicação que já vem sendo usada numa situação de gravidade em que o paciente tem risco maior de morrer. Para esse grupo, em UTI (unidade de terapia intensiva), o corticoide vinha sendo feito. Mas não havia uma publicação de peso que provasse isso (efeito contra covid-19)”, diz o chefe do setor de Infectologia do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc), Demetrius Montenegro. Ele acrescenta que, ao longo da epidemia, foi possível perceber que havia uma resposta boa para quem utilizava o corticoide, mas outros pacientes também morriam. “Isso mostra que não são todos que usarão que vão sobreviver. Certamente agora, contudo, estamos mais seguros em relação à indicação da dexametasona.”
Produzido por pesquisadores da Universidade de Oxford, da Inglaterra, o Recovery é um estudo estudo randomizado, duplo-cego. É um tipo de trabalho considerado como padrão-ouro para construção de uma evidência científica. Em nota divulgada ontem à imprensa, o presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia, Clóvis Arns da Cunha, relatou que se trata do primeiro tratamento farmacológico para covid-19 que mostrou impacto em reduzir a mortalidade. “Finalmente temos uma boa-nova!”, salientou Clóvis. O informe, assinado por ele, destaca que, com base no que apresenta o Recovery, todo paciente com covid-19 em ventilação mecânica e os que necessitam de oxigênio fora da UTI devem receber dexametasona via oral ou endovenosa. “Medicação barata e de acesso universal”, disse.
Segundo os responsáveis pelo estudo, para cada grupo de oito pacientes submetidos à ventilação artificial, uma morte foi evitada, graças ao uso do corticoide dexametasona. Ao tomar conhecimento dos resultados, a Organização Mundial de Saúde (OMS) celebrou o avanço científico. “É uma boa notícia e felicito o governo britânico, a Universidade de Oxford e os numerosos hospitais e pacientes no Reino Unido que contribuíram com esse avanço que salva vidas”, afirmou o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, em comunicado.
Participaram do estudo 11.500 pacientes de 175 hospitais do Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido. Entre eles, 2.104 que tinham covid-19 receberam dexametasona por dez dias, e 4.321 que não receberam esse corticoide. Os demais pacientes utilizaram outras medicações, cujo resultados ainda serão divulgados.
É importante frisar que o Recovery não traz um anúncio de cura, pois traz resultados sobre um medicamento que, aliado a demais cuidados hospitalares, ajuda a tratar o doente. “Não se trata de uma medicação nova que surgiu para tratar covid-19. A dexametasona não vai ter um efeito direto no vírus; ela vai ter um efeito na reação inflamatória que o vírus causa, levando ao comprometimento maior de falta de ar e à necessidade de oxigênio”, explica Demetrius. O médico acrescenta que as pessoas que desenvolvem forma leve de covid-19 teoricamente não precisam de corticoide. "Não se deve usar a medicação muito precocemente para evitar a fase mais grave. Utilizada em quadros muito iniciais, ela pode aumentar a replicação viral. Então, a dexametasona tem o momento exato de começar a ser usada."
Ele ainda sublinha que não precisa haver uma corrida às farmácias para se comprar dexametasona. “Não é uma medicação para todo mundo, nem é para prevenir covid-19, principalmente porque corticoide, usado de maneira indiscriminada, leva a efeitos colaterais. Não se deve usar sem orientação médica”, alerta o infectologista. Do JC
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